#74 – Tudo o que você gostaria de saber ou o que eu consigo contar...
... sobre o Festival Casarão Ano IX
Realizado nos dias 02, 03 e 04 de maio o Festival Casarão, em Porto Velho/RO, reuniu o que há de novo (e parte do melhor) entre jornalistas, produtores e músicos do circuito independente nacional, intitulado “Circuito Fora do Eixo”, além de seu braço político (de articulações e planejamento), por assim dizer, a Associação Brasileira de Festivais Independentes, ou simplesmente, ABRAFIN.
Nos dois dias que antecederam às apresentações de bandas houveram debates na biblioteca Francisco Meirelles. Temas como a atual cena musical brasileira, as mídias independentes, Circuito Fora do Eixo e ABRAFIN foram abordados, por pessoas que trabalham diretamente nisso. Fora isso o prometido debate sobre a cena rondoniense não foi realizado, por um simples motivo: falta de quorum. Isso mesmo, na hora de debater todo mundo “fugiu” ou não quis ficar, sei lá, restando apenas os debatedores e alguns gatos pingados. Até aí tudo bem, não debater parece ser uma tradição rondoniense, para depois bater na imprensa e nos produtores de fora pelas costas, com a consciência tranqüila de quem não fala na cara quando é devido ou necessário, ou seja, oportuno.
Mukeka di Rato por Cátia Burton Dos shows não tenho muito que dizer, até porque seria injusto. Assisti somente a quatro shows completos: Mukeka di Rato, Boddah Diciro, MQN e Hey Hey Hey. Mas vamos lá:
02.05. Sexta – Ver a DHC ao vivo era um desejo antigo meu, agora muito mais justificado, eles são A banda de hardcore cru de Rondônia. 20 anos de história não é para qualquer um e a banda demonstrou isso no palco, embora não seja um estilo que agrade todo mundo. Justamente entrevistando a DHC, juntamente com Rebeca Barca, perdi o show da banda Prysmman, de Vilhena. A repercussão da apresentação foi boa, embora logicamente as críticas aos covers viessem na mesma proporção. De qualquer forma o público ficou satisfeito, isso já é bom.
Incinerador e Visitantes eu peguei poucas partes, a primeira banda com um som pesado e coeso e a segunda coesa também, porém de uma sonoridade mais viajada e bacana de se ouvir, com direito à homenagem à Porto Velho. Das bandas da noite a que mais me surpreendeu foi a Underflow, de Manaus, já tinha visto eles no Zappeando e ouvido uma faixa ou outra, mas nada que dimensionasse a pegada que eles têm ao vivo. Muito bom. Bicho du Lodo e Do Amor perdi também. Estava entrevistando a Underflow para o Portal Fora do Eixo. E veio a Coveiros, a qual fez um bom show, mas como disse na resenha ao Fora do Eixo a dengue ainda afetava Hélio e Giovanni, deixando-os abatidos, mas mesmo assim fizeram um dos melhores shows da noite, com direito à músicas do disco recém lançado, além da clássica “Bunda peluda”. E Queens of the Stone Age...
Então veio o Mukeka, um show rápido, com uma música tocada em cima da outra, como todo bom show de hardcore tem que ser. E dá-lhe porradaria no ouvido e rodas no chão. Tocaram “Clube da Criança junkie”, nem esperava por essa e também mandaram bastante do disco novo “Carne”. A empatia da banda garantiu o que pra mim foi o melhor show da noite. Pode haver controvérsias por parte de outras pessoas, pode. Mas pra mim, nada muda, porque foi Foda (nesses termos mesmo). Não vi Cachorro Grande, acho que estava ajudando a arrebanhar gente para o ônibus ou coisa assim. Mas percebi que a comoção foi geral quando tocou “Sinceramente”.
Mr. Jungle por Cátia Burton
03.05. Sábado – As águas do (rio) Madeira estavam barulhentas, antes de chegar no Casarão dava pra sentir a pressão só de ouvir o som da água batendo nas pedras. Afim de adiantar os trabalhos lá fomos a equipe de comunicação do Fora do Eixo / Beradeiros entrevistar o máximo de gente possível, além de conversar com produtores, músicos e jornalistas sobre o festival, perspectivas, opiniões. Nessa pegada se passaram os shows de One Weak, Hellfire, Marlton e Sucodinois. Assisti a trechos, principalmente de Hellfire e SdS. Metal clássico e Psicore, depois falam que Rondônia não tem diversidade. Talvez porque ninguém por aqui se inspira em Arctic Monkeys e Franz Ferdinand pra fazer algo meia boca, pagar de indie e ser ovacionado. “Ah tem a Di Marco” alguém pode dizer, mas pelo menos a banda de Ji-Paraná tem personalidade e aplica uma personalidade própria, e faz bem feito, mais um ponto para a diversidade rondoniense.
Confesso que parei tudo o que fazia para ver o Boddah Diciro. Até porque tem muito tempo que acompanho a saga da banda para tocar em Rondônia. Conseguiram apoio para passagens aos 46 minutos do segundo tempo, chegaram, não tiveram muito tempo para passar som no palco e o show começou com as vozes esquisitas, quase vindas do além. Mas quando vieram... Uma performance muito boa, de todo mundo, mas as meninas chamam muito a atenção, não é por mal, mas é fato. Após o show conversei com os integrantes das bandas sobre isso, de mulheres subirem no palco e se afirmarem. Samia (guitarra) e Didia (bateria) não só se afirmaram, passaram por cima mesmo. Claro, com grande colaboração de Beto e Dan, guitarra e baixo respectivamente. De volta ao trabalho perdi boa parte das apresentações de Aliases, Mr. Jungle, Rádio Ao Vivo e Mezatrio. Teve um strip tease do Thiago “Aliases”, hard rock duro da Jungle, Rádio mandando as músicas que sei de cor e Mezatrio, com nova formação, mais enxuta, mas continua de nível.
Macaco Bong = artistas, pedreiros, instrumentistas e comunicadores. Tudo para definir esses caras que, segundo Pablo Kossa, representam a metade do que é feito de bom e original de rock independente no Brasil (a outra metade é a Porcas Borboletas). Cada show do Macaco é único, como disse Ynaiã, perdeu um momento? Já foi. E cada show é melhor que o outro, experiência de quem já viu três. Difícil é explicar o que caracteriza a banda, mas acho que é a sinergia da mão direita de Kayapy, do “pé-de-chumbo” Bertholdo e a concentrarão de Ney, ou então é a numerologia, devido a tantos “Y” juntos. Recato também não vi por completo, gostaria de ter visto. Ganharam o “joinha” da Tramavirtual, ou seja, agora são destaque no site. Como havia dois representantes da Trama no Casarão, o show deve ter sido muito bom. Ponto pra diversidade rondoniense também.
Aí sobe o MQN. Muitos, não só a banda, reclamavam do som da rave que constantemente era abaixado para ver se não interferia tanto nas bandas. Ouvi “Hard times”, “Breaking crystal stones”, “Eletrify”. Como disse o Fabrício em algum lugar: “é o rock duro do cerrado”. E dizem que não foi um bom show deles. Imagine se fosse?
Para encerrar a noite veio Dead Fish. Antes, no inicio da noite, tive a oportunidade de conversar com o baixista da banda, Alyand, sobre a banda, o passado duro da época DIY (em português “faça você mesmo”) da banda e de planos para 2008. Ele adiantou que em breve a banda entrará em estúdio para a gravação do novo disco e também que boas novidades estão surgindo para a banda, inclusive o apoio de um fabricante de instrumentos. Quanto ao show: frenético (tirado de um antigo disco ao vivo deles). O público não parava um minuto sequer, era a catarse do show mais esperado pela gurizada mais “independente”. Embora com uma guitarra a menos, e pelo jeito vai ser mantido assim, a banda ficou mais econômica, mas não menos melódica, e nem muito menos potente, pelo contrário, Phillipe se mostrou um guitarrista ainda mais completo. Como não posso deixar de falar, embora não tocassem “Noite” e “Tango”, fizeram um show muito bom, com direito a “Just Skate”, - a versão do Mukeka di Rato para ela é mais divertida confesso- e “Proprietários do Terceiro Mundo”, além de músicas dos discos que saíram pela Deckdisc (os mais recentes). Hardcore, tão hc quanto à volta do ônibus depois do Casarão...
Di Marco por Cátia Burton
04.05. Domingo – O domingo chega e bate a saudade de algo que ainda não havia terminado, mas já estava quase. Durante tarde de domingo tivemos uma reunião com Pablo Capilé, Fabrício Nobre, Pablo Kossa, Beradeiros, Catraia, Vilhena Rock, Aliases, se esqueci de alguém me perdoem. A reunião, muito produtiva e bem sacada, se estendeu e perdi o primeiro ônibus que levou o pessoal que saiu do hotel para o Kabana’s. Nisso perdi o show da Celula’Tiva (um dia eu assisto eles) e cheguei no final da Di Marco. A banda “da galinha branca” – piada interna – desceu do palco bem elogiada, não só pelo público, mas por produtores e jornalistas. Esses sim, podem tocar Arctic Monkeys e Franz Ferdinand sem medo, porque não são amarrados a elas. A Di Marco faz um som dançante, pop, mas sem ser melosa ou chata. Fora que a evolução deles de um ano pra cá é muito mais que evidente, pode confirmar quem acompanha a banda.
Perdi boa parte do show da Miss Jane e Esquerda Volver, mas deu para sacar que a primeira banda tá mais coerente com o som que se compromete a fazer, e até onde vi foi um show redondo, muito bacana, ainda no final entrevistei a banda, mas o áudio do trem lá (malditos termos técnicos) deu pau. E a banda curitibana foi bem também, apesar do pouco público que estava à frente de seu palco.
Aí sobe a Hey Hey Hey, e mesmo após conversar com o Marcos que dizia que erraram muito, fato que não me convenceu, pois a banda fez o melhor show de bandas rondonienses do festival. Pelo menos pude sentir isso. A Hey³ (deixo assim porque multiplicar os Hey’s se torna cansativo, hehe) viajou no som – distorções, inserções eletrônicas - reinventou-se, trouxe uma nova proposta de som para a cena rondoniense e sua – olha ela aí de novo – diversidade cultural.
Depois era a vez da Querembas. Os bolivianos simpáticos, sorridentes e um pouco tímidos deram lugar a uma banda furiosa. O new metal da banda bateu forte, como o bumbo da mesma, show para nenhum cabeludo (ou não) sair de lá sem bater cabeça. Pegada nervosa e super pesada com uma performance de palco igualmente poderosa.
A Ultimato eu perdi de ver, quer dizer, até estava em cima do palco, mas dividia meu tempo mais em ser xingado por pré-adolescentes que queriam tirar foto com a Pitty ou então dando uma mão na instrumentoteca, que nessas horas fervia de gente (jornalistas e tietes) para ver a maior atração do festival. Nada contra a banda tals, mas a assessoria da mesma poderia tratar as pessoas com mais educação, vai aí uma dica. Quem é mal assessorado pode acabar ficando com uma fama que não tem. A pegada da Ultimato continua poderosa (bom, pelo menos consegui ouvir a banda), e o show foi bem elogiado também.
Uma rápida passada no outro palco para ver Los Travecos Falsos (Ecos Falsos + Daniel Belleza). Insanidade e diversão se conjugaram ali, um show bem feito e super carismático, mas injustiçado pelo fato de ser do lado do palco da Pitty daonde vinha uns pedidos nada educados para que acabasse um show e começasse o “principal”. Alguns jovens são tão alienados que o guitarrista da Pitty (Martim) tocou com a banda dos “maricón” sem ser incomodado, tranquilamente. E dá-lhe xingamento para que um dos shows mais divertidos do festival acabasse para dar lugar à febre juvenil.
E sobe Pitty, para o delírio de muitos. Vi de longe, até tentei chegar perto, mas tenho mais medo de uma criança de grito agudo e uma máquina fotográfica digital nas mãos do que um cara de mais de 100 kg numa roda do Mukeka di Rato. Nada há de se negar: foi o show mais profissional, em todos os termos. Foi porrada, como muitos esperavam. Mas eu já não estava nem aí. Até me despedindo do pessoal já estava, atrás de gente que queria ir pro ônibus descansar até ir ao aeroporto ou hotel. E o festival termina, com uma pedra lançada no rio, agora é só esperar as ondas, que aliás, estão se tornando perigosas novamente. Tão perigosas e nem pensadas como um filme que já vimos no ano anterior. Pelo menos na edição anterior tivemos um final feliz...
Faltou algo?
Sempre falta, na parte logística houveram algumas falhas que se pode consertar. Mas faltou mesmo o show da Johnny Suxxx & The Fuking Boys, que não vieram devido a motivos de saúde do vocalista. Também senti falta da Made in Marte, que se estivesse na ativa 100% com certeza estaria no line up do festival e mais certeza ainda do bom show que sabemos que eles podem fazer. E seria mais um ponto da diversidade rondoniense.
Aliás, bati nisso o tempo todo, na diversidade rondoniense. Sempre falam que a cena rondoniense é pesada demais, com muitas influências de metal e hardcore. É um traço cultural e evidencia algo (que em Rondônia é fato) e que pretendo me aprofundar mais a frente: na falta de apoios oficiais (público e privados) e de produção, são essas vertentes que prevalecem, pois são firmes e autônomas, que abastecem o que há de independente, o “do it yourself”, em português, “faça você mesmo”. Ao contrário do que muitos dizem, eu acredito e afirmo a identidade e a diversidade cultural de Rondônia. Só citando nomes: Leão do Norte, Merda Seca, New Change, Mecânicos (Cacoal), Hawk Angel (Ji-Paraná), Strutura 6 (Vilhena) só citar as que não estiveram no festival. Me diz se alguma se parece com a outra aí?
Por fim, critiquem a vontade, afinal estamos aqui para isso. Lembrem-se este é um texto OPINATIVO. Não sou dono da verdade, nem você é. Então f* - se todos e vai ler um livro.